Paciente: Sexo feminino. Vinte anos.
Estresse pós-traumático. Alucinações visuais.
Avistamentos de um vulto, o "homem grande".
Cartas de tarô, de origem desconhecida.
Muda.
Mora só.

quinta-feira, 22 de março de 2012

O Retorno da lista de Jackson Ritter


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Sim, ele retornou. O folclórico produtor de set Jackson Ritter está voltando à equipe de Kassandra. O retumbante fracasso mostrado no épico A Obsessão do Slider mexeu com seus brios. Na devotada carreira de Jackson no audiovisual, este foi o seu segundo erro. Mas ele garante: será o último.

Por isso, Jackson retorna para as últimas cenas que serão rodadas em abril. E com ele voltam as suas listas de produção (veja aqui a primeira, a segunda, a terceira e a que supostamente era a última). A tarefa desta vez não é pequena: encher uma banheira com cerca de 200 litros de sangue falso.

E não esqueçam: semana que vem, Kassandra terá novidades!

1 - Ingredientes para o sangue falso: usar espessante de coco, já que Karo é caro e nesta quantidade deve causar diabetes imediatamente. Um exemplar do Diário Gaúcho liquidificado de molho em solução de água e corante está OK.
2 - Corante: corante alimentício não mancha, mas não dá consistência. Corante industrial dá consistência, mas deixou minhas mãos cor-de-rosa por umas horas...
3 - Teste de submersão: Conseguir uma banheira, produzir uns cem litros de sangue e mergulhar pelado nela. OBS: filmar o teste para fazer um viral.*

* NOTA: a produção de Kassandra desautoriza o uso das imagens deste teste em qualquer formato de exibição pública, sob a justificativa de que Kassandra é um curta de terror psicológico, não um terror hardcore de imagens pavorosas explícitas.

segunda-feira, 19 de março de 2012

As próximas novidades de Kassandra

Semana que vem, a produção de Kassandra terá novidades!

Mas nada de grande mistério: a partir de segunda, dia 26 de março, começaremos uma campanha de crowdfunding (ou financiamento coletivo) a fim de conseguir os recursos que faltam para terminar nosso filme.

Não sabe o que é crowdfunding? A ideia é simples: quem estiver interessado em ajudar no projeto pode contribuir com um valor em dinheiro e receber um brinde ou prêmio exclusivo da produção do curta. Quais são os  brindes? Ah, isso vocês saberão na segunda dia 26, mas certamente terá muita coisa legal! 

Contamos com a ajuda de vocês para finalizar o trabalho e para divulgar nossa campanha -- e assim, vocês também passam a fazer parte deste projeto. :)

Como diz Kassandra aí em cima: aguardem!

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quinta-feira, 15 de março de 2012

Música no set

Havia uma certeza sólida ainda nas primeiras conversas sobre Kassandra, antes mesmo de Roger Monteiro apresentar a primeira versão do roteiro: as filmagens teria música ambiente. 

O filme teria poucos diálogos e a maioria da sua sonorização acontecerá na pós-produção, o que permitia a presença de música no set sem atrapalhar no som ambiente. A ideia foi bem recebida pela equipe como um todo, mas especialmente pelo compositor Chico Pereira (foto), que fez um playlist para rodar não só enquanto as cenas eram feitas, mas também nos intervalos. Renata Stein igualmente apreciou a ideia: pôde escolher as próprias músicas para as cenas mais emotivas, auxiliando a sua atuação. 

Abaixo, dois exemplos das músicas tocadas nas primeiras filmagens de Kassandra. A primeira é uma peça de Phillip Glass, uma das referências coletadas por Chico, e a segunda é o tema do filme Réquiem Por Um Sonho, composta por Clint Mansell e que Renata escolheu para tocar repetidamente em alguns momentos da filmagem:

segunda-feira, 12 de março de 2012

Making of - 7 - A Saga Épica do Slider


Lembram-se das Listas de Produção de Jackson Ritter? Uma das tarefas do produtor de set era elaborar um slider, equipamento que serve para fazer pequenos movimentos de câmera. De acordo com ele, a tarefa estava cumprida. Será?

Jackson e Roberto Coutinho (produtor e engenheiro de som) se puseram à tarefa de fazer o tal slider, usando um pouco de madeira, um tanto de borracha, algum ferro-velho e muita falta de noção. 

O resultado desta verdadeira saga pode ser vista no vídeo abaixo, da sua concepção até o clímax, onde o slider é posto à prova pelo diretor de fotografia Pablo Chasseraux já nas filmagens.

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quarta-feira, 7 de março de 2012

As Mulheres de Kassandra

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Oito de março é o Dia Internacional da Mulher. Isso pede uma homenagem às meninas que estão trabalhando em Kassandra.

Ramona Barcellos, a deusa-mãe

No papel de diretora de produção, Ramona tratou a equipe como se fosse uma vasta família que não deveria passar trabalho. Fora as horas dedicadas à organização e logísitca, assim que as filmagens começaram ela se internou a cozinhar ali mesmo, no apartamento que servia de locação, para baratear os custos do curta.

Por Roberto Coutinho (produtor e engenheiro de som): "É muito bom trabalhar com uma mulher como a Ramona! Eficiente, responsável, atenciosa e organizada. Ela consegue manter a seriedade e ao mesmo tempo ser uma pessoa extremamente agradável e querida".
Por Victor Fiúza (assistente de direção): "Uma produtora que eu gostaria imensamente de trabalhar outras muitas vezes, já que ela dosa os atributos necessários para a gerência da produção ao mesmo tempo em que sustenta uma calma e controle reconfortates".
Por Ulisses da Motta Costa (diretor): "Quando a Ramona te olha com aqueles olhos infinitamente azuis e te pergunta 'mas será que vai dar certo?', tudo que tu quer é fazer o teu trabalho direito pra não decepcionar a 'chefa'".

Ana Gusson, a guerreira amazona

Ana era incansável, fosse no cumprimento de seu papel como diretora de arte, seja no cumprimento de qualquer outra tarefa. Quando tinha terminando o seu trabalho, ia imediatamente ajudar outra pessoa. Isso, claro, fora o acréscimo estético que ela deu aos cenários e ao visual do curta como um todo.

Por Roberto: "Se você ainda não conhece a Ana, está perdendo tempo! Mesmo cansada e estressada, ela está sempre com um sorriso no rosto. Não tem como ficar de mau humor ou entediado na presença dela. E para completar, é a melhor diretora de arte com quem já trabalhei!"
Por Ulisses: "Ela tem aquele jeito fofo que só as pessoas sem medo têm: a Ana não tem medo de te abraçar forte quando te encontra - e não tem medo de levantar a voz até pro diretor se achar necessário..." 
Por Maico Silveira (ator): "Uma doce menina que se assusta com qualquer oi".

Suzana Witt, a psiquê

Suzana consegue ser a alma das coisas mesmo quando tem um trabalho rápido para fazer. Não dá bola ao status de ser atriz e envolve-se rapidamente no meio da equipe, exercitando a tranquilidade que ela expressa na tela.

Por Leandro Lefa (ator): "A Suzana tem uma naturalidade invejável, parece ter anos de experiência com câmera. Melhor: parece que nem tinha uma câmera lá, só a Suzana, mandando ver".
Por Daniel Coutinho (publicitário do filme): "A Suzana é uma atriz de muito talento e uma pessoa muito querida. É um prazer trabalhar ao lado dela. Competência dentro do set de filmagem e ótima companhia para um bom papo e boas risadas nos bastidores".

Marina Cardozo, todas as musas em uma

A continuísta de Kassandra (que atuou como assistente de direção quando necessário) sabe fazer qualquer coisa de caráter artístico. Nos intervalos das filmagens, era fácil vê-la pintando num Ipad ou cantarolando. Mesmo na folga, ela continua fazendo arte - mantendo a empolgação sempre.

Por Roberto: "Além de ser uma grande parceira para indiadas, por mais chatas, idiotas e sem-noção que sejam, a Marina é a menina mais polivalente que eu conheço. Cada vez descubro uma nova faceta artística: escritora, bailarina, pintora, musicista, diretora, atriz, gourmet... Existe algo que a Marina não saiba fazer?"
Por Daniel: "Pessoa comprometida com trabalho e que está sempre de bom humor. A Marina é muito espontânea e divertida. Uma companhia muito querida dentro e fora do set de filmagem".

Isabela Boessio e Giulia De Cesero, as ninfas

Se uma risada ecoasse pela locação (e, às vezes, fora dela), todo mundo sabia: só poderiam ser as figurinistas Isabela e Giulia, também responsáveis pela maquiagem. Além dos risos, dedicação: Isabela chegou a "matar" sua prova de direção para estar no set, e Giulia convenceu o namorado a levá-la de carro às pressas para a locação para que todo o figurino estivesse à disposição antes do início da filmagem.

Por Ulisses: "Ter as duas na equipe é uma tranquilidade, sabemos que não teremos que nos preocupar com o figurino porque elas darão jeito em tudo, nem que o mundo esteja caindo. Fora, claro, que elas são lindas e curtem o programa de índio que é fazer um filme".
Por Chico Pereira (compositor): "Elas dão muita risada. Só isso já bastaria para todo mundo gostar delas. Mas, ainda por cima, elas são talentosas".

Renata Stein, a perséfone

Como a deusa da mitologia grega, Renata viveu em dois mundos. Apesar do jeito alegre e doce, não teve medo de mergulhar nas trevas para poder dar vida (e medo e angústia e ira) para a personagem-título de Kassandra, numa entrega que espantou a equipe.

Por Leandro Lefa: "A Renata faz a gente se sentir pequeno. É que a gente olha pra ela e percebe que ela tá pensando um milhão de coisas e parece que no "ação" um universo todo vai se criar pra complementar a atuação dela. Acho que de fato isso acontece".
Por Victor: "Atriz jovem, mas com profissionalismo e devoção ao ofício latentes, revelando uma maturidade precoce, em desenvolvimento e que por consequência, abre grandes espectativas por o que está por vir de seu trabalho". 
Por Chico: "Uma pedrinha preciosa. Um monstrinho como pessoa, no melhor sentido da palavra. Um monstro como atriz, no melhor sentido da palavra. E essas duas Renatas não parecem a mesma pessoa, o que prova o talento dessa guria para a atuação". 
Por Maico: "Menina de poucas palavras quando está trabalhando. Porque quando é a folga..."

quinta-feira, 1 de março de 2012

Relatos de Kassandra - III - as filmagens

As impressões da intérprete de Kassandra, Renata Stein, durante as filmagens do curta. Os relatos sobre os ensaios podem ser lidos aqui e aqui.



1º Diária - 07/01/2012

Foi um dia cansativo, na verdade, eu já cheguei um pouco "mole" no set de gravação. Parece que demorei o dia todo para me acostumar a trabalhar com tantas pessoas na sala da casa da Kassandra. Apesar disso, acredito que consegui alcançar o clima da vida de Kassandra rapidamente. Porém, isso me fez ficar a diária toda quieta, observando e muito concentrada, o que me deixou um pouco "pra baixo".

A concentração me ajudou na cena mais difícil do dia, a Cena 5, quando precisei chorar, e mesmo assim foi muito complicado. Eu me senti sensível a toda situação, me envolvi, me emocionei, mas a lágrima não saiu tão fácil. Sei também que muito dessa dificuldade se dá devido os muitos cortes que tem entre um take e outro, fazendo muitas vezes esfriar o clima. As lágrimas, as poucas lágrimas, saíram após um olhar do diretor Ulisses. Me ajudou pensar que eu poderia estar decepcionando ele.

A presença do meu colega de elenco Maico me fez sentir melhor, já que era uma das poucas pessoas que eu conhecia bem e me sentia a vontade como Kassandra. Eu cheguei no set já me preparando para ser Kassandra, conheci a maioria das pessoas lá mesmo e não tive oportunidade para me entrosar com elas. Assim me pareceu que só o Maico e o Ulisses estavam acreditando no meu trabalho, e isso me deixou mais reclusa durante as gravações.

Conversando com o diretor, percebemos que isso é uma das diferenças entre teatro e cinema. São muitas pessoas trabalhando no set, cada um com uma função e concentrada totalmente nela, muitas pausas para trocar o enquadramento e a luz e eu, no caso, sozinha sem outros atores, tentando me concentrar. No teatro são meses de preparação e ensaios, sempre com os mesmos atores, criando uma relaçãoo de confiança. E depois temos a apresentação, onde temos os olhares todos voltados para nós.

Cheguei em casa exausta e extremamente sensível.

2º Diária - 08/01/2012

Hoje o dia foi mais leve, em questão de concentração e sensibilidade. Cheguei mais à vontade no set e o Maico chegou mais cedo, e a Suzana Witt estava lá também. Assim eu ri e me descontrai mais, porém fez eu ter mais dificuldade para me concentrar em certas cenas depois. Percebi que, por mais que seja pesado ser Kassandra, é necessário muita concentração para sê-la. Assim voltei um pouco para a reclusão para não falhar. Senti cheiro de café durante um bom tempo, por causa da camisa do meu colega de elenco Leandro Lefa.

O que foi pesado hoje foram as cenas de ataque, de fuga e de outros desastres, ou seja, muita pancadaria e  como resultado, muitos roxos. E o complicado do dia foi resolver as cenas com os passarinhos, afinal parece que todos eles tinham algum problema parecido com o da Kassandra, todos doidinhos. 

Cheguei em casa satisfeita.

3º Diária - 09/01/2012

Eis o Homem Grande. Hoje ele resolveu aparecer. Foram gravadas as cenas com ele, com sangue e a maioria das cenas com plano detalhe.

Que dia cansativo e estranho. Não sei, ou melhor, não sabemos dizer o porquê, mas estava esquisito. Achei o diretor mais impaciente hoje também (será que ele vai me permitir postar isso?).

Não por isso, mas hoje não achei que dei tudo de mim. Acho que era cansaço mesmo. Ser Kassandra cansa. E apesar de todo o cansaço, no final das gravações eu permaneci lá no set. Preguiça? Despedida? Ou seria apenas o maravilhoso pãozinho da Ramona e a massagem do Maico que me prenderam lá?

Kassandra agora só nos próximos meses com muito mais sangue e cores.

Agradeço muito a toda equipe que contribui para a concretização desse curta e que esta dando vida a um sonho do Ulisses, e que agora também é meu.

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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O Artista e os novos Filmes Silenciosos


Texto de Ulisses da Motta Costa, diretor do curta Kassandra, sobre a atual tendência de filmes mudos:

A consagração de um filme preto-e-branco e mudo ontem à noite, na cerimônia do Oscar, pode parecer algo surpreendente. O Artista, produção belgo-francesa que faz uma homenagem ao cinema norte-americano das primeiras décadas do seculo XX, ganhou cinco estatuetas: melhor filme, diretor (Michel Hazanavicius) ator (Jean Dujardin), trilha sonora (Ludovic Bource) e figurino (Mark Bridges). No entanto, ela não é um caso isolado.

O filme olha para o passado da sétima arte para buscar um novo referencial, numa época de crise criativa no cinema norte-americano. Buscar em outros tempos as bases para se reconstruir ou reformar as artes é algo que acontece com frequência na cultura humana. Desta forma, o aparente arrojo estético de O Artista, na verdade, é parte de um "movimento" (na falta de um termo melhor) de buscar narrativas mais visuais. 

Ou, talvez, o termo melhor que me falta seja "tendência": na última meia década temos visto pipocar exemplos de filmes baseado cada vez menos nos diálogos.

Do cinema norte-americano, é fácil lembrar de exemplos recentes: a animação Wall-E, da Pixar; os 15 minutos iniciais de Sangue Negro, de Paul Thomas Anderson; ou ainda cenas cruciais de Planeta dos Macacos - A Origem. Da mesma França que produziu O Artista vem Sylvain Chomet, que dirigiu dois longas de animações mudos, As Bicicletas de Belleville e O Mágico. No Festival de Gramado de 2009, vi uma comédia dramática uruguaia, Gigante, que mal precisava de diálogos ou de música para contar sua história.

Mais forte do que a pergunta de porquê os realizadores destes filmes tomaram essas decisões é a constatação de que filmes de gêneros, origens e intenções tão distintos tenham funcionado tão bem com a proposta de não usar falas para dar movimento à narrativa. O Artista, claro, vai mais a fundo: sequer tem som ambiente, ruído de qualquer tipo, folleys ou efeitos sonoros (fora em duas cenas) -- apenas a trilha sonora. Afinal, a intenção era recriar um cinema do passado e por isso o processo de imersão tinha que ser mais intenso, incluindo aí a fotrografia em preto-e-branco e outros elementos característicos.

O filme me chamou a atenção quando estávamos recém na pré-produção de Kassandra. Lógico: nosso pequeno filme também é em preto-e-branco, praticamente prescinde dos diálogos e tem uma protagonista muda. Claro, essas escolhas não tem a pretensão de dialogar com o passado, mas são baseadas no que acreditamos que funcionará no clima do filme. A "culpa" por algum sentimento de falta de criatividade não chegou a me acertar; pelo contrário: fez-me sentir dentro de uma conjuntura mais ampla, "pertecendo" a algo maior e mais poderoso.

Nossas fantasias com o filme não envolvem um caminho tão longo, lógico. Mas há agora uma sensação de que percurso que tomamos parece mais certo do que poderíamos supor.

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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Making of Kassandra - 6 - Mistérios


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No novo vídeo de making of de Kassandra, os debates do elenco a respeito do roteiro -- abordando especialmente os aspectos de mistério presentes na história. Luis Franke, em especial, traça algumas teorias sobre eles (como podemos ver na foto acima). 

Confira aí!

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Um pouco sobre terror e horror - 2/2

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(continuação - leia aqui a parte 1)

A Bela e a Fera em filme francês
de Jean Cocteau
 
A Bela Contra a Fera
Quase podemos resumir a maior parte dos filmes de Terror como releituras do conto da Bela e da Fera (sem a ênfase amorosa). Inúmeros são os filmes em que mulheres enfrentam criaturas perversas (de Alien, o Oitavo Passageiro a O Silêncio dos Inocentes). As conotações sexuais estão intrínsecas, em maiores ou menores graus de sutileza: de certa forma, representam a pureza que alguma monstruosidade (masculina) quer destruir. Como tendem a serem contos morais, contudo, nestas histórias a pureza feminina fatalmente vencerá o diabólico.

É o ocorre em Nosferatu, clássico do Expressionismo Alemão: a mocinha atrai o assustador vampiro para o seu próprio quarto e oferece seu pescoço. Embriagado de sangue, o monstro não nota o sol que nasce e se desfaz na luz do dia. Em seu último sacrifício, a mártir entregou seu amor para matar o mal. A antítese do medo não é, no Terror, a coragem: este é um elemento típico da Epopéia. Aqui, o contrário do medo é o amor. A Fera pode ser redimida (ou libertada) pela Bela. Portanto, sob determinada ótica, a história de Terror é uma história de triunfo feminino: são as qualidades de mulher que podem desbaratar o mal.

É curioso ver (se quiséssemos aprofundar as diferenças entre o Épico e o Terror como representantes de uma "guerra dos sexos") como o sangue cumpre papel importante, porém diverso, na narrativa. O Épico também é sanguinário, mas os jorros de sangue são uma celebração masculina: são heróis tirando a vida de heróis em batalha. Na narrativa assustadora, o sangue é algo mais vital, a ser preservado ou a ser buscado a todo custo, indicando mais vida do que morte – tendo uma relação mais íntima com a menstruação, por exemplo.

Monstro marinho que teria
sido morto no Brasil
em 1564, conforme relatos
O Homem contra o Mal
Este tipo de história é um reforço à construção feminina da Bela contra Fera, e não seu contraponto. É uma subversão do mito do Herói que desce ao covil de uma criatura malévola e a destrói, simbolizando a vitória da luz sobre as trevas. É um tema caro às mitologias, seja Davi com Golias ou Batman com o Coringa. Quando relidos pelo Terror, tais contos recebem outro tratamento. A caça à besta é um verdadeiro pesadelo, não um ato de heroísmo (em Tubarão, o covil é o mar). E é sempre claro: o heroísmo é trágico (ou pior: inútil) e não raro o mal prevalecerá (como em A Profecia).

Uma segunda forma de classificar este tema é o Homem contra os Demônios: uma jornada infernal contra várias forças malignas, normalmente uma descida ao inferno (como a que Dante faz na Comédia), onde, de todo modo, as ações estão alheias à vontade do protagonista. Seu correlato contemporâneo mais comum é o filme de zumbi: não importa o quanto o herói seja resoluto ou preparado, ele jamais impedirá a invasão e o alastramento dos mortos-vivos.

O motivo do fracasso do herói é explicado no tema da Bela contra a Fera: coragem não basta; para combater o mal, apenas o amor tem a força necessária.

Capa da edição de 1831
de Frankenstein
O Monstro em Todos Nós
Personagens como a criatura de Frankenstein são essencialmente trágicos. São anti-heróis típicos das Tragédias, com a diferença que o tratamento dado à sua marcha infeliz é mais sombrio, ou possui cores mais berrantes. As lendas de Édipo se aproximam do Terror: assassinato do pai, abuso da mãe, automutilação. As jornadas dos monstros são obscuras e sombrias e, fatalmente, finalizam com sua desgraça ou destruição.

Virtualmente, costuma-se usar o termo "monstro" para designar algo hediondo, aberrante – portanto, representante do mal. Seria um sinônimo para Fera. Contudo, as origens latinas da palavra podem tanto significar “mostrar” quanto “aviso”. Ou seja, o Monstro é alguém ou algo que se revela e dá um aviso. A sua diferença em relação ao anti-herói trágico é o seu visual deformado – que nos faz lembrar as nossas próprias construções psíquicas retorcidas. O Monstro exterioriza aquilo que escondemos em nós – e, por definição, está em situação de desamparo frente ao mundo, o que ressalta sua índole trágica.

Ao contrário dos exemplos anteriores, o Monstro Interior é uma leitura masculina para as histórias assustadoras, em que o monstro nada mais é do que uma representação do homem que não encontra nem seu lugar na sociedade e que busca amor eternamente. King Kong, apesar de seu poder e força, “entrega-se” ao amor apenas para ser arrancado do seu habitat e levado para um lugar infinitamente mais hostil que a selva repleta de dinossauros da sua ilha.

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Em suma: por repulsivas que sejam, as histórias de Terror/Horror têm como objetivo um contraponto a um mundo e um comportamento idealizado no Épico. São histórias não para serem contadas em praça pública, à luz do dia, mas no escuro das noites, dentro de casa, a fim de ensinar morais e éticas mais simples e mundanas. Seria a história de terror uma resistência feminina a um mundo masculino? É uma hipótese interessante.

Texto escrito pelo diretor Ulisses da Motta Costa.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Um pouco sobre terror e horror - 1/2

Olá, aqui mais uma vez Ulisses da Motta Costa, diretor de Kassandra. Durante as preparações para as filmagens do curta, escrevi este texto para elenco e equipe - a respeito do gênero terror. Resolvi dividi-lo com vocês. O texto terá duas partes:
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O primeiro filme de terror/horror,
O Gabinete do Doutor Caligari
Em português, não costumamos fazer diferenciação de significado entre os termos “terror” e “horror”; grosso modo, eles são considerados como sinônimos. Usamos “terror” para definir quando uma pessoa tem um comportamento indomável (“fulano é um terror”), e “horror” para dizer que uma situação era catastrófica (“o incêndio foi um horror”). Mas, quando aplicados no sentido de gênero narrativo, tanto faz: querem dizer a mesma coisa.

O mesmo não acontece nas culturas anglofônicas. Terror e Horror têm significados distintos quando são aplicados a filmes, livros, quadrinhos. De maneira básica (e sem maiores verificações teóricas), em termos narrativos, o Terror é o sentimento que precede uma experiência assustadora; já o Horror é a sensação que se tem após tal experiência. Ou seja, o primeiro é ligado ao medo; o segundo, ao choque.

H.P. Lovecraft
Dentre os dois, considera-se o mais “nobre” o Terror, pois ele depende de uma construção gradual de ansiedade e incômodo. Há uma necessidade de se criar solidamente a sensação de medo; por outro lado, quando esta construção chega ao seu clímax e presenciamos o assustador que se promete no decorrer da narrativa, nossa sensação subsequente é de choque. Uma boa história assustadora investe, podemos dizer, no Terror durante seu desenrolar e deixa o Horror para o espectador assim que termina.

Por que o Terror/Horror funciona enquanto narrativa, por repugnante que possa parecer? De acordo com H.P. Lovecraft, escritor americano notável pelos seus contos assustadores, “a emoção mais antiga e mais forte do homem é o medo, e o medo mais antigo e mais forte é o medo do desconhecido”. Fruir de uma história que  provoca medo nos faz notar esta sensação em nós – e o “papel” das artes é fazer com que lembremos que temos certos sentimentos -- ou seja, que estamos de fato vivos.

Barba Azul por Gustave Doré
Não é à toa que os elementos assustadores permeiam obras consideradas de outros gêneros: as mitologias de civilizações ancestrais são repletas de seres e situações asquerosas; os contos de fada são sanguinolentos e crueis. Na Odisseia, medo é a sensação que impera na caverna do ciclope e na descida ao inferno; em Macbeth, o terror das bruxas se estabelece já no prólogo (não à toa que Orson Welles, ao transportar a peça ao cinema, deu-lhe uma roupagem gótica mais assemelhada a um filme de terror do que a um épico).

Assim, Terror e Horror têm uma origem ancestral, apesar de suas especificidades enquanto gênero. Para todos os efeitos, são Tragédias (as gregas são vastamente brutais) que se aprofundam no lado sombrio dos anti-heróis. Dentro do campo trágico, podemos dizer que há três temas caros ao terror, que vamos chamar aqui de: A Bela contra a Fera, O Monstro em Todos Nós e O Homem contra o Mal. Um pouco sobre eles:

(continua)


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